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Influente e atuante, Gilmar assume posto de ministro mais antigo do STF 296840

Para o 'superdecano', a prioridade agora é garantir a governabilidade do país eh6l

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h26 - Publicado em 9 jul 2021, 06h00

Dependendo da posição do observador, o ministro Gilmar Mendes pode representar personagens absolutamente antagônicos. Em 2016, o Supremo Tribunal Federal mudou o entendimento que tinha até então e ou a autorizar os juízes a decretarem a prisão imediata de réus condenados em segunda instância. Foi uma das mais importantes vitórias da Lava-Jato, um golpe aparentemente letal na tradição de impunidade. Até então, a infinidade de recursos à disposição de quem podia pagar bons advogados combinada com a morosidade da Justiça transformava em miragem a punição de criminosos, especialmente os de colarinho-­branco. Na época, Mendes, como já aconteceu inúmeras vezes, foi celebrado por uns e atacado violentamente por outros. Na versão dos críticos, ao costurar nos bastidores a decisão que permitiu levar à cadeia um naco da República, o ministro teria dado vazão ao ódio que supostamente cultivaria contra o PT. A nova regra levou à prisão o ex-presidente Lula, retirou o petista da disputa presidencial e, segundo alguns, ajudou a pavimentar o caminho para o triunfo de Jair Bolsonaro.

Um ano depois, Gilmar Mendes se transformou num dos mais contundentes críticos dos métodos usados pela Lava-Jato, liderou uma investida judicial que resultou no fim da operação e, como consequência, abriu o caminho para a anulação de muitos processos. O maior beneficiado foi exatamente Lula, que teve suas condenações por crime de corrupção invalidadas, recuperou os direitos políticos e está livre para disputar as eleições de 2022. Dessa vez, aqueles que antes reverenciavam a coragem do ministro aram a detratá-­lo. Os que antes o hostilizavam, se converteram em intransigentes iradores. Desde que assumiu a cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), em 2002, Mendes se envolve em pesados embates. No governo Lula, denunciou publicamente a existência do que classificou como o embrião de um “Estado policial”. Ao defender a abertura de um processo eleitoral contra Dilma Rousseff, disse que a Justiça não podia permitir que o país se transformasse num “sindicato de ladrões”. Mais recentemente, acusou Jair Bolsonaro de implementar uma “política genocida” de combate à pandemia.

Aos 65 anos, dezenove deles no STF, Mendes assume a partir do próximo dia 12 o posto de decano da Corte, título dado ao ministro mais antigo do tribunal. Em tese, é apenas um cargo honorífico. Na prática, não será assim. Ao ser indagado sobre o papel que cabe a um decano, ele não hesita em delimitá-lo: “Ter uma certa representação do próprio colegiado, ter voz em momentos de crises internas e externas”. Em outras palavras, agir — o que, para ele, não é apenas retórica. “Infelizmente esses momentos de crise têm se amiudado, têm se tornado bastante frequentes, embora talvez não fossem desejáveis essas sucessivas crises, mas isso é o que a gente tem vivido nos últimos anos”, disse a VEJA. Mendes ressalta que a prioridade de momento é garantir a governabilidade do país. “Um estado de ingovernabilidade é uma ameaça à estabilidade institucional”, acrescenta (veja a entrevista). O ministro, aliás, tem sobre sua mesa uma ação com potencial de abalar algumas dessas estruturas. Em agosto, quando terminarem as férias da Justiça, deve entrar em pauta o julgamento de um recurso que causa muita apreensão no Planalto. O Supremo vai decidir em que tribunal deve tramitar o processo em que o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) é apontado como beneficiário da prática conhecida como rachadinha. Dependendo do veredicto, o caso em que o filho do presidente é acusado de recolher para si parte dos salários de seus funcionários quando era deputado estadual no Rio de Janeiro pode retornar para a primeira instância, onde se encontra praticamente concluído, ou ser definitivamente sepultado. A interlocutores, Mendes, que é o relator da ação, considera que as transações envolvendo o senador estão na raiz de boa parte dos episódios de instabilidade no governo.

O INDICADO - Mendonça: para Mendes, “um dos quadros mais qualificados” -
O INDICADO - Mendonça: para Mendes, “um dos quadros mais qualificados” – (Isac Nóbrega/PR)

O futuro decano é de longe o ministro que mais se aproxima do mundo político — e quase sempre o primeiro a ser acionado quando há necessidade de interlocução com outros poderes. As relações de Jair Bolsonaro com o Supremo foram marcadas pela desconfiança desde o início do governo. No ano ado, o presidente se convenceu de que era alvo de uma investida por parte do tribunal, que estaria disposto a lhe tolher os poderes. Embora na época o decano fosse outro, coube aos juízes considerados mais políticos, principalmente Mendes, tentar aparar as arestas com o Executivo. Não raro, também partiram do próprio magistrado o estopim de algumas refregas. Foi dele a costura — fracassada — de um acordo que, no início do ano, daria aval jurídico à reeleição do deputado Rodrigo Maia para a presidência da Câmara. Foi dele também uma das declarações mais duras contra o presidente Jair Bolsonaro — a de que um “genocídio” estava em curso — pela falta de coordenação do governo na condução da pandemia. Foi dele o cálculo político para declarar a suspeição de Sergio Moro no caso Lula.

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Mesmo quem o critica reconhece que a posição de decano do STF, num momento crucial para o país, estará em muito boas mãos nos próximos anos. “Gilmar tem sólida formação jurídica, não teme o conflito com os colegas e é o mais eloquente dentro e fora do STF. É tido como um estrategista, com enorme leitura da Corte e dos demais poderes, e conversa com o Legislativo e com o Executivo”, avalia Davi Tangerino, professor de direito penal na FGV Direito São Paulo. Nos últimos meses, o ministro discutiu com senadores oposicionistas as linhas gerais da I da Pandemia, que investiga as ações do governo federal no enfrentamento da Covid, e, em sentido diametralmente oposto, também atuou como instrutor informal de Bolsonaro sobre a importância de medidas de combate ao vírus. Mendes também já se reuniu com o advogado-geral da União, André Mendonça, o candidato do presidente da República à vaga aberta no Supremo com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello. “Pelo histórico de sua atuação na AGU, André talvez tenha alguma dificuldade no Senado, mas é um dos quadros mais qualificados do governo”, alfineta e avaliza o ministro.

Apesar da contundência de algumas de suas declarações, Mendes garante que não cultiva inimigos. Em uma das conversas que manteve nos últimos meses com Jair Bolsonaro, o futuro decano ouviu do presidente a explicação de que boa parte dos erros do governo derivavam da inexperiência da equipe. “Se a gente já tivesse experiência, não teria trazido o Sergio Moro, que foi um desastre para o meu governo”, confidenciou o ex-capitão. O ministro não perdeu a oportunidade de exercitar sua conhecida verve: “Não fale isso, presidente. Ter tirado o Moro de Curitiba e tê-lo devolvido para o nada já foi uma grande contribuição ao país”. Imagina se o futuro decano cultivasse inimigos.

Publicado em VEJA de 14 de julho de 2021, edição nº 2746

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