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“A favela adotou o rugby” 6aon

Mauricio Draghi usa a modalidade para apoiar jovens que vivem com a pobreza e o crime em Paraisópolis 91y55

Por Diogo Magri Atualizado em 4 jun 2024, 11h48 - Publicado em 8 out 2022, 08h00
Mauricio Draghi -
Mauricio Draghi – (Antonio Milena/.)

Eu tenho 45 anos e pratico rugby desde os 14. O esporte chegou aqui no Brasil junto com o futebol, há mais de um século, mas não se popularizou. Ficou na elite. Fui atleta da seleção brasileira juvenil e adulta e sempre paguei para jogar as competições mundo afora. Meus companheiros também tinham condições privilegiadas. Foi com a ideia de mudar essa realidade e oferecer os benefícios da modalidade a um público segregado que, em 2004, eu e um colega de clube, Fabricio Kobashi, resolvemos apresentar o rugby às crianças de Paraisópolis, uma das maiores favelas de São Paulo e do Brasil. Como morador do Morumbi, um bairro nobre na Zona Sul de São Paulo e vizinho de Paraisópolis, sempre tive um contato superficial com a comunidade, por meio de funcionários de casa ou da escola particular onde eu estudei. Então, fizemos um esforço para levar a seleção brasileira juvenil até um campo lá e montamos um museu em uma escola para apresentar esse esporte.

Esperávamos quarenta crianças, mas apareceram umas 100, além de um monte de mães interessadas na atividade, mesmo sem saber o que era aquilo. Foi uma iniciativa pontual que, já naquele dia, percebi que teria de se tornar continuada. Surgiu ali o Rugby para Todos. Começamos a ir duas vezes por semana. Chegávamos com licença (de criminosos que atuam na favela), pedíamos um cantinho no campo para quem mandava ali e sempre fomos bem recebidos. De cara, amos a atender 150 alunos. Só que logo vimos que o projeto iria demandar mais recursos do que tínhamos e que teria de cumprir uma parte além da esportiva. Havia aluno que chegava com dor de cabeça porque não tinha comido. Outros não tinham tomado banho. Era possível constatar a carência de muitos, que recebiam na prática do esporte uma atenção que não tinham da família.

A aprendizagem para lidar com essas demandas foi acontecendo em paralelo com as aulas. No começo, eu levava bolo de banana que a mãe de um amigo fazia. Ao longo dos anos, desenvolvemos uma metodologia transdisciplinar para atender às necessidades dos mais jovens aos quase adultos. Com crianças até os 14 anos, atendemos a família, porque sabemos que, se não fizermos, a criança não vai. Então trabalhamos, ao lado do esporte, os pilares da alimentação, saúde e educação. Já com os maiores de 15 anos pesa mais a vontade própria, o que nos faz focar no encaminhamento para o mundo do trabalho e na gestão de carreira. Dezoito anos depois, viramos uma referência no esporte educacional do país. Temos vinte profissionais, dos quais oito são ex-alunos, entre nutricionistas, fisioterapeutas, comunicadores e outros. São 280 matriculados e inspiramos uma centena de iniciativas em comunidades por todo o país que se baseiam no ensino do rugby.

E tem o legado esportivo. Paraisópolis virou o local no Brasil com mais atletas de rugby por metro quadrado. Vinte jogadores que conheceram o esporte aqui já aram pelas seleções brasileiras masculina e feminina, entre juvenil e adulta. Duas foram atletas olímpicas em Tóquio. Uma delas, Bianca Silva, é uma das melhores do mundo. Antes era eu, o branquinho de classe média, que falava aos alunos que o rugby me fez rodar o planeta. Hoje eles vêm que uma pessoa igual a eles conseguiu, e isso é gratificante. Somos um celeiro de craques tão grande que, em vez de mandar jogadores a outros clubes, montamos o nosso, Leões de Paraisópolis. No ano que vem, jogaremos na elite paulista. Ainda sobrevivemos aos trancos e barrancos, dependemos da Lei de Incentivo ao Esporte e temos o desafio de diversificar receitas. Na pandemia, achei que tudo morreria, mas só nos fortalecemos. Acredito que vamos seguir existindo porque temos um vínculo muito forte com nossos alunos.

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Mauricio Draghi em depoimento dado a Diogo Magri

Publicado em VEJA de 12 de outubro de 2022, edição nº 2810

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