A divergência negada por Fux e Moraes, mas que existe (com muitos fatos) 3x1v2f
Entenda 1f6k58

Os ministros do Supremo Tribunal Federal resolveram usar o julgamento mais importante da história recente da corte para mandar recado para jornalistas — inclusive para este colunista — sobre um tema que circula sim nas rodas de poder em Brasília, e não só no judiciário: a de que Luiz Fux ou a ser um antagonista de Alexandre de Moraes na primeira turma do STF.
Eles negam o conflito dizendo, como fez o ministro Fux, que quem diz isso apurou mal. Na verdade, existem muitos fatos para comprovar a informação de que eles estão em campos opostos, mas antes leiam o que disse um dos dois ministros nesta terça, 6, ao julgar o “núcleo da desinformação”, responsável por espalhar fake news, ataques contra o processo eleitoral, instituições e até autoridades na trama golpista bolsonarista.
“Se alguma coluna apurou que eu estou aqui para fazer alguma frente ao ministro Alexandre Moraes, apurou muito mal. Porque, na verdade, eu estou aqui mantendo pontos de vista que me parecem que são os adequados à luz da minha visão de Direito Penal”, afirmou Fux, declarando “lealdade” ao colega de toga relator do caso.
“Na verdade, o que há aqui não é discórdia, o que há aqui é dissenso”, disse Fux. “Eu respeito as posições do ministro Alexandre de Moraes, como também tenho certeza que ele respeita as minhas posições de divergência”, completou.
Vamos à lista de fatos sobre a divergência entre os dois apenas no caso da tentativa de golpe, sem entrar em outros processos como o recente sobre o ex- presidente Fernando Collor:
No primeiro dia de julgamento, quando os ministros ainda estavam decidindo sobre a aceitação da denúncia contra o núcleo crucial formado por Jair Bolsonaro e outros, Fux sinalizou que poderia acolher, mesmo que parcialmente, teses dos réus no mérito do processo, diferentemente de Moraes.
No mesmo dia, fez ressalvas das mais fortes à delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid e defendeu que o caso como um todo fosse para o plenário do STF. Alguém tem dúvida no país, pelo menos entre os brasileiros que acompanham o noticiário, de que Moraes tem opinião absolutamente oposta?
Ainda no dia do julgamento da aceitação da denúncia de Bolsonaro, Fux deu sinalizações de que as penas aplicadas aos golpistas do 8 de Janeiro estavam altas demais. Após isso, mudou o voto e defendeu uma pena de um ano e seis meses para a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, a “mulher do batom”, para a qual Moraes deu pena de 14 anos de prisão.
Ou seja, um 18 meses, o outro 168 meses, o que é bem diferente. Mas o mais relevante é que Fux a condenou apenas por deterioração de patrimônio tombado. E rejeitou as acusações de crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito. Para Fux, ela apenas subiu na estátua e escreveu “perdeu mané”. Para Moraes, ela fez parte de uma conspiração para acabar com a democracia no país.
Como mostrou o Estado de S. Paulo, o ministro Moraes teve de apresentar um complemento ao voto no plenário virtual da Primeira Turma para rebater o colega. Na resposta, Moraes disse que a situação da cabeleireira “não apresenta diferenças significativas” em relação aos 470 réus já condenados pelo STF por envolvimento nos atos golpistas.
Fux também defendeu que é preciso diferenciar atos preparatórios de uma tentativa de golpe de uma tentativa de abolição do estado democrático em si. Moraes juntou tudo em uma coisa só. Uma tese do STF é que golpe concretizado não se julga porque os novos donos do poder não deixariam.
Fux e Moraes podem se gostar, ter respeito um pelo outro, mas eles estão interpretando as leis e os eventos recentes da história do Brasil de forma totalmente diferente, tanto no 8 de janeiro, quanto na trama golpista, fatos interligados.
Mesmo nesta terça, 6, a única divergência na primeira turma após os pedidos dos advogados foi de Fux. A notícia do dia, novamente, é a de que um ministro se colocou frontalmente contra a unidade da primeira turma.
Não adianta criticar a imprensa, até porque não se trata de fazer intriga. Não é a vida social dos dois, ou de amizade, que é importante, mas o fato de que, diante dos mesmos eventos, os dois juízes têm dado penas diferentes e imputado crimes diversos aos acusados. Está posta, sim, a divergência entre Moraes e Fux.