Mia Couto participa de evento do Rio Capital Mundial do Livro r3i5u
Autor compartilhou reflexões sobre masculinidade, família e contou quem são suas inspirações literárias brasileiras 84427

O escritor moçambicano Mia Couto participou, nesta quinta-feira, 22, de um evento comemorativo do Rio Capital Mundial do Livro. O encontro, mediado pelo autor brasileiro Carlos Eduardo Pereira, foi uma iniciativa da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, em parceria com a Academia Brasileira de Letras, a Companhia das Letras, a Janela Livraria e o Estação Net Gávea, que sediou o evento. A palestra contou com a presença do secretário de Cultura do Rio, Lucas Wosgrau Padilha.
Mia Couto compartilhou o reflexo que seu núcleo familiar teve, e ainda tem, sobre suas obras. Autor de O Fio das Missangas, A Confissão da Leoa e Mulher de Cinzas, ele tem clássicos marcados pelo protagonismo feminino, com histórias profundas em diferentes contextos sociais.
“Eu sou de uma geração em que ser homem era uma coisa, uma obrigação o tempo inteiro. Eu já tive que renegar uma porção de coisas que no fundo estavam dentro de mim, um certo tipo de sensibilidade. Na minha casa, que era uma família muito nuclear, a minha mãe era a única mulher, mas ela era a contadora de histórias”, conta Mia Couto.
A família do escritor e biólogo saiu de Portugal em 1953 para fugir da ditadura de Antonio Salazar. A distância dos parentes e as dificuldades que essa realidade implicava em sua vida tiveram ligação direta com a sua aproximação com o mundo das histórias.
“Na época, meu pai tinha sido preso. Era um regime fascista e eles tiveram que fugir para Moçambique. Minha família sabia que não podia voltar para Portugal. Portanto, nós não conhecemos nunca nenhum avô, nenhum tio. Essa construção familiar não existia. Eu acho que minha mãe teve a grande sacada de saber ‘esses meninos precisam dessa ligação’, então ela contava histórias com uma espécie de apresentação de cenários, que nos aproximava, de certa forma”, lembra.
Quando questionado sobre a relação com a literatura brasileira, o autor se lembrou de grandes nomes e disse que marcaram sua trajetória e carreira como escritor.
“Guimarães Rosa foi uma influência na minha vida, sem dúvidas. Foi ele quem abriu a porta. Ele já tinha essa coisa de fazer com que essas vozes, que tem um outro modo de olhar o mundo, entrassem dentro da escrita, desarrumassem a escrita, ganhassem uma linguagem ou outra. Por razões mais opostas, Graciliano Ramos, João Cabral de Melo Neto, Drummond de Andrade, também foram importantes. Há uma lista. Manuel Bandeira era o poeta de predileção do meu pai, então também me marcou”, afirmou.
“Mia Couto atravessa oceanos, reconstrói palavras, não só em português, e faz a fantasia servir à ficção histórica. É um gênio universal presente em nossas bibliotecas, casas e até em listas de vestibulares. Encontros com autores, em parceria com livrarias e editoras, promovem toda a cadeia produtiva do livro: da criação à distribuição e venda. Isto estimula a experiência física, fundamental, para a leitura. Comunidades de leitores e livreiros estão no coração dos eventos da Capital Mundial do Livro”, afirmou o secretário de Cultura do Rio, Lucas Padilha.
A conexão entre a Africa e a América Latina tem elos históricos profundos que refletem ainda hoje a realidade de países como Brasil e Moçambique. “É muito importante que campanhas como esta sejam feitas, para aproximar ainda mais o público leitor de autores africanos. Sessões com coletâneas de contos, textos, poesias, com autores de lá em livrarias brasileiras seriam uma iniciativa muito interessante”, comentou o escritor Carlos Eduardo.
O evento fez parte de uma programação especial, que contou com outras intervenções na Livraria Travessa de Botafogo, Ipanema e Barra Shopping.